sexta-feira, 9 de setembro de 2016

A Olimpíada que eu vi



Acho que a título de contextualização, seria interessante a leitura das duas primeiras partes dessa trilogia inesperada. Seguem os links abaixo.




Se chegaste até aqui, mereces continuar...

Eis que então, dois anos depois de uma Copa do Mundo no Brasil chegam as Olimpíadas do Rio. Novamente convocado pelo amigo Ben Kohn, me organizei, preparei e marquei minhas férias para estar disponível e montar novamente em um tornado diário.

A ansiedade era diferente da que tive antes da Copa. O tempo de permanência era menor, caso as meninas não fossem, o tempo longe seria menor. Diferentemente da Copa, eram vários esportes, vários ícones e, portanto, mais chances de ver a história esportiva sendo escrita. Já tinha uma ideia do que seria o trabalho, mas estava curioso pra saber como se daria a rotina. Sem mencionar o agravante da mudança. Nos mudamos na semana anterior à viagem, dormiria uma noite na casa nova e viajaria no dia seguinte deixando a mulher e a filha, caixas fechadas, uma casa sem armários nos quartos e na cozinha e tudo o que temos espalhado.

Então, dia 28 de julho embarquei para o Rio deixando dois terços do coração pra trás. Cheguei à noite e fui direto pra um dos hotéis que melhor recebem nossa família, o Sudré-Arashiro Tijuca Palace.
No dia seguinte, após longo papo pra matar a saudade dos amigos, programei o dia: de manhã vou à clínica no Centro tirar o atestado que o COI estava pedindo, ligo pra alguns amigos e familiares para tentar vê-los ao longo do dia, passo na Elsevier, dou um pulo no Senac pra fazer uma surpresa pra umas amigas, etc. Isso porque deveria me apresentar só no dia seguinte no hotel para fazer o check-in e iniciar os trabalhos.



Ainda na clínica recebo a ligação do Ben. Mudança de planos. Era pra eu fazer o check-in no hotel e seguir assim que possível para o International Broadcasting Center (IBC). Era um presságio do que me aguardava. Como diria a BandNews, em 20 minutos tudo pode mudar.

Peguei o atestado, entrei no metrô pra Afonso Pena, fiz check-out no primeiro hotel, estreei o Uber, me bati pra Barra, fiz o check-in no Hotel Tropical e peguei carona com uma das vans que estavam trabalhando conosco para ir ao IBC. Cheguei e lá estava meu amigo Ben para me receber. Um papo rápido, credenciamento feito e bora entrar que está tudo funcionando.

 

Quando entrei pela primeira vez na estrutura, ficou claro pra mim que seria diferente da Copa. Eu já havia ficado impressionado com o que tinha sido montado no Riocentro em 2014. Mas aquilo ali era um monstro muito maior. O tamanho e o volume de pessoas circulando davam o tom da magnitude que seria a jornada.

Lá, já dentro da área da BBC, com o mapa do Parque Olímpico na mão, pude dimensionar onde estávamos e que loucura seria percorrer todos os locais de jogos e provas. O Parque Olímpico por si só já era gigantesco. Imaginar as tarefas circulando por ele e pelas outras áreas começou a me dar uma ansiedade enorme.





 

 
Embora tenha conhecido algumas pessoas e estado na base da BBC no IBC, meu trabalho começou mesmo no dia 30. O trabalho, basicamente, seria atuar como facilitador para uma das três equipes de rua que a BBC teria circulando pelas Arenas. A equipe que ficaria o tempo todo comigo seria um câmera e um técnico de som. Dependendo da filmagem, vinha um produtor e um repórter diferente. Ivan e Doug ficariam com as outras duas equipes de rua. Nós três remanescentes da Copa. Ben e Allan (The Boss e outro remanescente) atuariam na coordenação dos facilitadores (fixers), runners (turminha de universitários animada que dava suporte tanto no IBC quanto nos estúdios em Copa) e motoristas.

Trabalho informado, restava conhecer a equipe e entender como seria a rotina propriamente dita. Primeira missão seria pegar a equipe no hotel (próximo ao meu, na Barra) e seguir para o IBC, onde eles fariam algumas filmagens.

Na chegada ao hotel, conheci o Senhor Wilson. Militar reformado e sócio no grupo de vans que estavam prestando serviço para a BBC. Sempre arrumado, carro limpo, sorriso no rosto e uma fala tranquila que alentava a correria que viria a seguir. O mês dentro da van nos permitiu alguns papos e posso dizer que aprendi algumas coisas com ele. A que mais me marcou foi o “Plano B”. Senhor Wilson sempre sacava a teoria do “Plano B” do bolso quando explicava como tinha conseguido chegar mais rápido, mais perto, ou quando conseguia desviar ileso (nós e a van) de alguma manobra ensandecida de um motorista desavisado. Ele dizia: “Você tem sempre que ter um plano B pra tudo. Está vendo aquele carro ali na frente? Meu plano A é ficar aqui nessa faixa, mas se ele sair dali com um movimento brusco, eu tenho de ter um plano B pra não dar problema. E assim é pra tudo na vida.” (Completava com um sorriso no rosto.) Esse é o Senhor Wilson, cuidadoso e atencioso ao extremo. Foi um prazer enorme conhecê-lo e, se não fosse por ele, é fato que meu trabalho seria muito mais difícil e menos prazeroso.


Aguardamos um pouco até que Simon (câmera) e Garreth (som) chegaram. Ambos muito simpáticos desde o início. Simon já foi da BBC e hoje tem a Karma, uma produtora em Londres (cujo lema é mais ou menos, fazemos grandes filmagens, grandes filmagens deixam nossos clientes felizes, nossos clientes felizes nos pagam para fazer o trabalho que amamos). Garreth trabalha pra ele. O cara é super conceituado, tem um olho cirúrgico e para muitos é um rabugento. Algo que pra mim não fez sentido, sempre gentil, com comentários ácidos e o desejo de fazer o melhor possível. Nesta frente, algumas lições também puderam ser aprendidas. A mais interessante era conseguir fazer o trabalho que precisa ser feito, buscando o melhor, independentemente dos obstáculos, da maneira mais educada que possa existir. No começo do terceiro dia com eles eu entendi que a desatenção com as orientações de caminho e restrições de filmagem dadas por voluntários ou pelo pessoal da OBS (Olympic Broadcasting Services) enquanto ele escaneava o ambiente nada mais era que um “migué”. Ao entrar em qualquer ambiente de prova ele vinha observando o lugar, ouvia as orientações e seguia para outros lugares, montava rapidamente a câmera e filmava até alguém vir e dizer que não podia filmar ali naquela área. Ele prontamente parava, se desculpava de todas maneiras possíveis, perguntava para onde tinha que ir e seguia seu rumo agradecendo a informação. No caminho, ele seguia para um segundo ponto que já havia mapeado, trocava a lente e começava a filmar novamente até alguém vir e dizer que não podia filmar ali naquela área. Ele repetia a sequência de desculpas, perguntava pra onde tinha de ir e seguia, sem deixar de agradecer educadamente as informações. Então seguia para um terceiro ponto que lhe apetecia e fazia a mesma coisa. Quando chegávamos na área que era destinada a filmagem daquele esporte, ele já tinha duas ou três tomadas de ângulos diferentes para encaminhar para a edição.








Garreth é mais novo, mais caladão. Demorou um pouco pra se soltar. A namorada passou boa parte da Olimpíada com ele no Rio. Embora tenha sido assaltada, circulou pela cidade com a desenvoltura de uma local e não se intimidou por não estar acompanhada por ele na maior parte do tempo. Passeou, foi à praia, a diferentes locais de competição, enfim, divertiu-se. Ambos muito simpáticos e quando estavam juntos era sinal de que algo ia acontecer. Passaram na frente de um restaurante que estava inaugurando e foram convidados a entrar e comer e beber de graça; o mesmo aconteceu em um quiosque; presenciaram tiroteio na frente do bar onde tinham ido beber; viram uma medalha de ouro do Brasil num bar cheio na Lapa e ganharam bebidas na comemoração, virando melhores amigos de uns locais. “People are so friendly...”, costumavam dizer espantados. 








A dupla já estava entrosada. Com o passar dos primeiros dias e nosso cuidado com os detalhes, eu e o Senhor Wilson nos encaixamos na forma deles trabalharem e pudemos contribuir para que eles fizessem o melhor trabalho possível sem ter de se preocupar com o resto.


Uma das minhas preocupações, por ter passado pela experiência da Copa, era tentar me poupar ao máximo fisicamente. É um trabalho que te consome física e mentalmente com o passar do tempo. E embora a Olimpíada tivesse quase dez dias a menos de trabalho que tivemos na Copa, agora a sinalização era de que não teríamos nenhuma folga. O que era fácil de se imaginar com tanta coisa acontecendo ao mesmo tempo. Poupei-me na primeira semana, mas quando os jogos começaram pensei “quando é que vou estar envolvido nisso de novo e dessa forma?” E embora tivesse em mente que minha obrigação ali era atender aquela equipe, ao findar dos trabalhos eu tentava espiar ou assistir algumas coisas.

 

Munido deste espírito, no primeiro dia em que me arrisquei, encaminhei a equipe com o motorista para o hotel (a essa altura eles já estavam à vontade conosco para isso, iam tranquilos) e parti pro Parque Olímpico munido da minha credencial (que só não dava acesso à parte interna da Vila Olímpica). Nesta noite andei feito um condenado para conseguir entrar na Arena onde estava tendo um jogo do time masculino de basquete norte-americano. Peguei os três minutos finais e parecia uma criança de tão feliz. Depois de quase meia hora andando e três minutos de jogo, parti pras quadras de tênis. Fui pelo som. Entrei e Nadal estava jogando duplas contra Del Potro. Saí desta quadra ainda mais entusiasmado com o que tinha visto. Na saída, gritaria na quadra da frente. Armado da credencial, entrei e vi o último set da dupla brasileira que derrotou o Djokovic e seu parceiro. Festa! A noite estava completa. Ainda passei na quadra principal para ver como estava e vi Nishikori derrotar o Millman. 

Anestesiado pela noite, nem me importei com a viagem que era sair de dentro do parque, ir para a área dos ônibus no IBC que saíam a cada meia hora para diferentes lugares. Peguei um que me servia e cheguei no hotel de madrugada.


Nós só sabíamos o roteiro do dia seguinte (que horas deveríamos sair, pra onde, quem iria, fazer o que) entre 22h e 23h da noite anterior. Isso gerava uma certa apreensão, até para planejar o horário, o caminho e, dependendo do dia, o local. E mesmo assim, descobrimos com o passar dos dias que tudo poderia mudar. Por exemplo, em duas ocasiões marcaram filmagens para as 14h do dia seguinte. Na primeira, acordei mais tarde, tomei café e fui dar uma caminhada na praia na expectativa de um mergulho depois de um longo tempo. Dez minutos de caminhada e o telefone toca: “Mudança de planos, precisamos de vocês em uma hora no IBC.” Liga pro motorista, pede pra ele voar pro hotel, liga pra equipe pede pra se aprontarem em 20 minutos (levávamos em torno de 25 do hotel até o IBC, mais uns 5 pra passar pela segurança e caminhar até o QG da BBC), corre pro hotel pra tomar banho e se vestir em 15 minutos. Na segunda ocasião, já com um tempo chuvoso, acordei mais tarde, liguei pro Senhor Wilson e o deixei de sobreaviso, arrumei minhas coisas e desci pra tomar café já pronto. Toca o telefone: “Mudança de planos, peguem o fulano no hotel tal e sigam pra Deodoro que o Rugbi de 7 vai começar em 2h (geralmente as equipes chegavam com duas ou três horas de antecedência das provas ou jogos para fazer imagens, enviar material e chamadas para a base). Daí pra frente virou uma brincadeira entre nós, toda vez que chegava o e-mail, nos falávamos pelo Zapzap e terminávamos: “...Se alguém não ligar dizendo mudança de planos!”



A essa altura já funcionávamos como a filial brasileira da Karma. Algumas coisas deixaram de ser perguntadas por ambas as partes e a engrenagem funcionava da mesma forma. Eles diziam o que queriam, quando e como; o Senhor Wilson garantia o quando e eu me desdobrava para viabilizar o “o que” e o “como”. Uma rotina organizadamente bagunçada acontecia dia após dia. Ao final do trabalho, sem sentimentalidades, cada um seguia com seus interesses. Simon não saía tanto, ficava mais no hotel. Garreth saía pra beber. Eu quando dava não saía, apenas não voltava; ficava no parque para tentar assistir o que desse.

Posso dizer que no meu tempo livre vi o que quis. Mas foi durante o trabalho é que pude acrescentar variedade à qualidade do que estava vendo. Assisti rúgbi, hóquei, arco e flecha, ginástica, ciclismo de rua, ciclismo de pista, triatlo e até cavalos dançantes. Fui capaz de aprender algumas regras de alguns esportes que não conhecia. Familiarizei-me com esportes distantes da minha realidade. Pude ter certeza de que não me interesso por cavalos dançantes – digo isso com a certeza de quem olhou aquilo por mais de seis horas seguidas.



















À medida que as semanas foram passando, foi crescendo a nostalgia do que ainda não havia se encerrado. Estava participando, vivenciando, respirando aquilo tudo. Ia acabar e não tinha um próximo evento sobre o qual eu pudesse despejar a saudade que aumentava. Ao mesmo tempo, o cansaço batia na porta, não tivemos folga desde o início dos trabalhos, que foi uma semana antes do início das Olimpíadas. Meus corações não foram dessa vez. Embora o Facetime tenha sido bastante útil, faltava o abraço, o beijo. Estava pronto pra retornar. Mas como encerrar?



















Pensei exatamente nisso no sábado 20/8. Tínhamos ido cobrir o triatlo cedo em Copacabana. Sol quente, previsão de encerramento por volta de 14h; meia hora para enviar o material pela rede para o IBC (nos poupava uma ida até lá); previsão de saída para o hotel por volta de 15h. Ainda antes do fim da prova olhei no aplicativo e vi que a disputa do ouro no futebol masculino começava às 17h30. Cocei a cabeça. Embora fazer conta não seja meu forte – fiz Letras –, calculei que se a coisa andasse naquele compasso talvez desse para eu tentar ir ao Maracanã e tentar entrar com a credencial que eu tinha (apesar de ser um evento de muita procura e já nos terem alertado que nesses casos, além da credencial, era necessário um convite impresso). Prova encerrada quase que pontualmente e fomos para o contêiner para mandar os arquivos. Como tínhamos uns 35 minutos até que tudo fosse mandado, fomos conhecer os estúdios da BBC em Copa, do outro lado da rua. Em papo com os outros fixers, descobri que alguns estavam se preparando para pegar carona com uma das vans para irem ao Maracanã tentar entrar no jogo. Me animei mais e pedi uma vaga na van. Obviamente, só iria depois do trabalho terminado e a equipe colocada em segurança na van do Senhor Wilson de volta para o hotel.

Eis que surge o famigerado “change of plans”. Antes de terminar a transmissão dos arquivos a equipe tinha sido convocada em regime de urgência para gravar uma entrevista ali mesmo no estúdio. Pensei na hora, “Babou meu jogo”. Recolhe os equipamentos, corre pro estúdio, prepara tudo e aguarda. O entrevistado, presidente do Comitê britânico, chega sem atraso e tudo acaba fluindo surpreendentemente rápido. Agradece, desmonta equipamento e retorna pro envio das imagens. Enquanto eu e Garreth aguardávamos, a turma que ia pro Maraca se organizava pra sair. Avisei pra não se prenderem porque ainda tinha de aguardar e colocar a turma na van pro hotel. Quando o Simon voltou, liguei pro Senhor Wilson e pedi que ele nos encontrasse voando na rua de trás do estúdio. Saímos nós três e mais dois que pegariam carona de volta pro hotel. No caminho lembrei que tinha deixado o celular carregando no estúdio. Voltei sozinho e pedi a eles que aguardassem dois minutos. Pego o celular já descrente de qualquer colaboração do universo e corro de volta. Chego na Atlântica e o Senhor Wilson, sempre ele, tinha conseguido se esgueirar nos bloqueios e acenava com todo mundo já dentro da van. Cheguei na porta e avisei que ele levaria todo mundo pro hotel e que eu ficaria por ali pra tentar entrar no jogo do Maracanã. Chamei o Garreth. Num primeiro momento disse que não, cansado, ia pro hotel. Após alguma insistência e uns argumentos fortes (como o fato de ele, fã de futebol, ter vindo ao Brasil e não ter ido ao Maracanã) ele resolveu bancar a tentativa.

Partimos procurando alguma rua já aberta e com trânsito fluindo. Eram 16h e o jogo começava 17h30. Buscando Uber no celular caminhamos três quarteirões e nada andando e o tempo passando. Perguntei a ele se ele estava interessado em uma “full experience” e ele não se opôs. Corremos pra estação Cantagalo do metrô. Fila enorme pra comprar bilhete. Segundos de desespero e lembrei do cartão que recebemos no credenciamento que nos dá um valor mínimo pra transporte. Estava com o meu. Corremos pra catraca, passei o cartão pra ele, aguardei e passei de novo... havíamos conseguido o transporte. Muvuca, empurra empurra, cantoria, verde e amarelo predominando e eu comecei a me perguntar se tinha sido uma boa ideia trazer o cara. Olhei pra cara dele e o sorriso igual ao de uma criança quando entra na RiHappy me tranquilizou. Trem chega, boiada agrupa, porta abre, deixa o corpo seguir o fluxo. Já dentro do vagão, feito salsichas no pacote, a cantoria tomou conta. Entre gritos, músicas e papos de pessoas que se viam pela primeira vez, Garreth olha pra mim dando risada e fala: “Isso é muito legal. As pessoas conversam no vagão. Lá em casa não é assim!” 

Muitas estações depois, chegamos à Estação Maracanã. Descemos e seguimos rapidamente com o fluxo, precisávamos descobrir onde era a entrada da imprensa. Quando chegamos na rampa sobre a Radial Oeste ele parou: “Oww maaaaaan, it’s amazing.” Pausa para foto. Aceleramos o passo, fui me informando no caminho e chegamos à fila gigante que estava formada na área da imprensa. Falei pra ele guardar a posição que eu ia dar uma olhada na entrada. Fui percorrendo a fila e observando se os jornalistas que ali estavam tinham alguma pulseira ou ingresso na mão. Parei alguns segundos do lado das pessoas que estavam direcionando os jornalistas para as cabines de revista pra ver o procedimento de entrada. EM um primeiro momento eles só escaneavam a credencial, se ela estivesse ok, encaminhavam pras cabines. Voltei pra fila, agora era esperar a nossa vez e ver o que dava.

Eram 17h10 quando chegou nossa vez. Credenciais escaneadas, revista feita, nós dois lá dentro. Breve comemoração e passo rápido pra descobrir onde ficaríamos. Procuramos alguma área que tivesse o nome da BBC na área de filmagem. Nada. Voltamos pra área da imprensa. Voluntários nas escadas conferiam os ingressos numerados. Segundos de análise e disse: “Vamos pela outra escada, desce atrás de mim e age como se aquelas cadeiras fossem nossas.” Seguimos para a escada oposta, descemos determinados com a cerveja na mão, passando pelos voluntários e sentamos nas primeiras duas cadeiras que estavam vazias. Agora era esperar. Então nos demos conta que tínhamos conseguido, estávamos dentro do Maraca, sentados, aguardando a final olímpica. Comemoramos! Fotos, brindes, risadas, times entram, jogo começa e chegam dois alemães chacoalhando ingressos dos assentos que estávamos. Levantei puto olhando pra cara deles. Garreth perguntou: “Pra onde vamos?”. Não tive dúvidas: “Senta aqui na minha frente.” E nos sentamos na escada. Dez minutos depois a mesma estava tomada.

Do jogo só posso dizer que fui uma montanha russa de crença e descrença alternadas do início ao fim. O Garreth estava mais atuante que eu, reclamava, vibrava, queria aprender a música pra cantar junto e a cada dez minutos de voltava pra mim e dizia: “Muito obrigado por ter insistido. Nunca vivi uma atmosfera assim. Talvez uma vez quando meu time chegou à final da Champions. Mas isso aqui é diferente. Estou no Maracanã.”




É campeão!!! É campeão!!!

 




Na jornada de volta pra Barra só conseguíamos rir e recordar a odisseia do dia. Paramos na Happy Street pra almoçar às 21h e celebrar a vitória junto com um mar de gente. Garreth tinha comprado a bandeira do Brasil e estava enrolado nela. Quando começava a cantoria ele tirava a bandeira, balançava no ar e tentava murmurar o que era cantado. De verdade, não sei que estava mais feliz, eu ou ele. E a comemoração foi maior ainda quando recebemos durante a celebração o e-mail informando que no dia seguinte não haveria gravação. Tinha acabado, era relaxar.

No domingo, levantei obviamente mais tarde e marcamos de ir ao IBC apenas para levar uns equipamentos e nos despedirmos de algumas pessoas. Seguimos para lá depois do almoço. Bateu uma nostalgia, era a nossa última viagem para lá. No caminho passa um filme rápido de tudo o que pudemos ver e vivenciar naquelas semanas. Para mim, inesquecível. Pude vivenciar os dois maiores eventos esportivos do planeta em casa, vendo de dentro. Dois sonhos realizados em dois anos. No que coube à minha atuação, missões completas com louvor e cliente satisfeito, sem baixas e em plena segurança. Quando chegamos lá, estava em paz comigo mesmo, tinha terminado e muito bem, com chave de ouro literalmente na noite anterior.


Resolvi entrar com eles uma última vez pra me despedir de pessoas que certamente não veria mais. Ao entrarmos no QG, uma das responsáveis havia acabado de perfilar as runners e começar um discurso de agradecimento, ao fim do qual as presenteou com ingressos para a cerimônia de encerramento. Festa das meninas, aplausos de toda a equipe e muitos agradecimentos. Minutos depois, ainda aguardando minha turma, uma outra chefona me abordou e iniciou um discurso sobre o quanto participar de um evento desse em casa era significativo. O discurso dela terminou com ela me oferecendo seu ingresso para a cerimônia daquela noite. Certifiquei-me de que ela realmente estava me oferecendo o ingresso e aceitei. Do jeito que estava, uma hora depois (já com a minha turma com o Senhor Wilson de volta pro hotel) estávamos a caminho do Maraca no último ônibus que saiu do IBC para lá.

Ruas interditadas nos arredores e o ônibus não conseguia acesso. Conversei com o motorista e avisei o bando de repórteres que estavam no ônibus. Descemos perto da São Francisco Xavier, seguindo o moço de boné vermelho (yo), todos caminharam em meio a uma forte ventania e alguns respingos até a Eurico Rabelo. Apontei a entrada da imprensa a todos e dali em diante era cada um por si.

Seguimos tentando achar a entrada e os lugares. Nisso a garoa já tinha começado. Vale destacar que a turma pagou caro por coxinha ruim e sanduíche duro na lanchonete da sala de imprensa antes de seguirmos buscando nossos lugares. Já resignados, batemos cabeça algumas vezes até encontrarmos nosso setor. Tamanha foi nossa surpresa e alegria quando descobrimos que nosso setor (reservado) tinha um hall com boca livre (sanduíches variados, sobremesas, bebidas, aperitivos, etc). Já devidamente abastecidos, seguimos para as cadeiras. Todo mundo recebeu uma capinha de chuva da voluntária que conferia os ingressos e buscou abrigo nas cadeiras protegidas da chuva pelo anel superior do estádio. Já sentado, alimentado e feliz da vida por estar ali, pensei “É uma vez na vida...” e avisei a turma: “Galerinha, vou lá pra baixo, pra mureta, pra chuva. Inté!”

E assisti, debaixo de chuva e vento testemunhei a catarse coletiva de público e atletas ao final de um sonho que estava completo.





Penso que temos que viver cada momento como sendo único. Por mais próximo ou parecido que seja, jamais existirão dois iguais. Se vou ver outra Copa ou Olimpíada in loco, não sei; em casa, possivelmente não. Mas mesmo que isso acontecesse, jamais seria a mesma coisa. Só tenho que agradecer e ser eternamente grato ao amigo que se lembrou de mim para essas jornadas, à minha esposa que empurrou quando necessário e segurou as pontas quando foi preciso e aos familiares e amigos que acompanharam tudo tornando a jornada menos solitária.

Obrigado querido Pierre de Frédy.